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Resenha de “Obsessões e fobias: seu mecanismo psíquico e sua etiologia (1895[1894])”, de Freud

  • Foto do escritor: César Assis
    César Assis
  • 3 de jun. de 2019
  • 4 min de leitura

Atualizado: 7 de ago. de 2019

O texto “Obsessões e fobias: seu mecanismo psíquico e sua etiologia (1895[1894])” é parte das primeiras reflexões propriamente psicanalíticas de Freud. Nele, o autor esboça as características e as fronteiras entre a obsessão e a fobia.


Não se trata em hipótese alguma de uma reflexão definitiva sobre tais neuroses, tendo em vista que elas receberam análises mais aprofundadas e precisas nas décadas posteriores. Em verdade, como todo texto freudiano, esse trabalho funciona como um retrato ao modo como o autor estava delineando os conceitos fundamentais de seu pensamento. Naquele momento, já se explicitava a divisão consciente e inconsciente, a centralidade da repressão de impulsos sexuais e agressivos nas neuroses, os processos de deslocamentos em representações substitutas e a complexa dinâmica entre representação e afeto.


Para Freud, a obsessão possui dois correspondentes: 1) Uma representação que se impõe ao paciente. 2) Algum estado emocional particular associado, que pode ser de dúvida, remorso, angustia, raiva, culpa, medo, entre outras emoções. Diferentemente, na fobia a única emoção associada é a angustia.


Apesar de o estado emocional na obsessão ser de diferentes tipos, este permanece constante em cada caso, enquanto a representação a ele associado varia. Afirma Freud:

“(1) o estado emocional persiste indefinidamente e (2) a representação associada não é mais a representação apropriada original, relacionada com a etiologia da obsessão, mas uma representação que a substitui, um sucedâneo dela” ([1895[1894]] 2006 p. 80).


Em seus exemplos, Freud relata o caso de uma jovem que sentia certo grau de remorso por toda sorte de razões: por ter cometido um furto, mal tratado as irmãs, ter fabricado dinheiro falso. Ou seja, o remorso era persistente, independente do objeto. Em outro caso analisado, era a dúvida o estado emocional da obsessão (dúvida se havia ou não realizado qualquer tipo de ato corretamente).


De acordo com Freud, por meio de investigação da história prévia do paciente, pode se chegar à representação original que foi substituída. Introduzindo a questão da sexualidade na obsessão, afirma o autor:


“Todas as representações substituídas têm atributos comuns, elas correspondem a experiências realmente penosas na vida sexual do sujeito, que ele se esforça por esquecer. Consegue meramente substituir a representação incompatível por uma outra, mal adaptada para se associar com o estado emocional, o qual, por sua vez, permanece inalterado. É essa mésalliance [falsa ligação] entre o estado emocional e a representação associada que explica os disparates tão característicos das obsessões” (idem, p. 80).


O autor ilustra a obsessão com alguns exemplos. Uma jovem condenava-se por coisas absurdas, que não tinha feito, imagens eram formadas de acordo com o que ela tivesse lido durante o dia. Em verdade, tratava-se de uma autocondenação por sua masturbação compulsiva. Outro jovem também se recriminava por toda sorte de atos imorais (ter matado o primo, violado a irmã, colocado fogo em uma casa), sendo estes substitutos de sua autocondenação por sua masturbação. Outras mulheres se queixavam de um impulso obsessivo de se atirar pela janela, ferir seus filhos. Na verdade, estas mulheres estavam insatisfeitas em seus casamentos e tinham que lutar contra desejos e ideias voluptuosas com relação a outros homens.


Em outros casos:

“a representação original foi substituída, mas não por outra representação — foi substituída por atos ou impulsos que serviram originalmente como medidas de alívio ou como procedimentos protetores, e que são agora grotescamente associados a um estado emocional que não lhes é adequado, mas que permaneceu inalterado e continuou a ser tão justificável quanto em sua origem” (idem, p. 82).


Freud dá alguns exemplos de atos obsessivos ritualizados que algumas pessoas tomaram como defesa a uma representação original incompatível. Uma moça era tomada pelo impulso de contar. Tal obsessão iniciou-se como meio para ela desviar a sua mente de “tentações”. Outra mulher sofria de temores hipocondríacos e especulação obsessiva. Tal obsessão iniciou-se a partir de seu medo de enlouquecer, que foi refreado por meio de especulações que asseguravam para si a sua sanidade. Tais processos de defesa se autonomizaram da representação original, mantendo constante o estado emocional.

Assim como a histeria, a obsessão é uma neurose de defesa contra uma representação insuportável à consciência. O que torna impossível o desaparecimento do estado emocional é o próprio ato de substituição da representação.


Como já foi comentado, enquanto as obsessões são variadas e especializadas, a fobia, diferentemente, é mais monótona e típica, sendo a emoção relativa a ela sempre de angustia, de medo.


Sobre a fobia, Freud a divide em dois grupos: 1) Fobias comuns, isto é, medo exagerado de coisas que todos detestam ou temem em alguma medida (noite, solidão, morte, doenças, perigos em geral, cobra). 2) Fobias contingentes, isto é, “medo de condições especiais que não inspiram medo ao homem normal: por exemplo, agorafobia e outras fobias de locomoção [….] o estado emocional só aparece, nesses casos, em condições especiais, que o paciente evita cuidadosamente” (p.85), ou seja, não possui um caráter obsessivo.


Naquele momento, para Freud, a substituição não é um traço importante no caso da fobia:

“Nunca se encontra nada além do estado emocional de angustia que, por uma espécie de processo seletivo, traz à tona todas as representações adequadas para se tornarem alvo de uma fobia. No caso de agorafobia etc., encontramos frequentemente a recordação de um ataque de angústia, e o que o paciente de fato teme é a ocorrência de tal ataque nas condições especiais em que acredita não poder escapar dele” (idem, p. 85).


Para o autor, a causa da fobia seria o acúmulo de tensão sexual produzida pela abstinência ou pela excitação sexual não consumada. A fobia pode também se combinar com a obsessão, como parece ser o caso da mulher que sofria de especulações obsessivas. Tal obsessão se desenvolveu para atenuar o seu medo de enlouquecer.


Nesse texto, o tratamento da fobia foi bem menos detalhado do que o da obsessão. É somente nos trabalhos posteriores sobre os casos do Pequeno Hans (1909) e Homem dos lobos (1918[1914]) e em Inibição, sintoma e angústia (1926) que Freud aprofunda a análise da fobia nomeada como histeria de angústia.


Referência bibliográfica

FREUD, Sigmund. Obsessões e fobias: seu mecanismo psíquico e sua etiologia (1895[1894]). In: FREUD, Sigmund. Primeiras publicações psicanalíticas (1893–1899). Edição Standard Brasileira das Obras Psicológicas Completas de Sigmund Freud. Volume III. Rio de Janeiro: Imago, 2006. 75–88p.


Data de Publicação:

Junho/2019

 
 
 

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César Assis

Antropólogo e Psicanalista

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Criação: Ágora Escritório de Comunicação

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